Conhece o segredo Dinamarquês para a Felicidade? ‘Hygge’

O povo mais feliz do planeta nos contagia com o segredo para apreciar os bons prazeres da vida

O segredro Dinamarques para a felicidade, Hygge

Chama-se hygge (pronuncia-se huga) e, tal como a palavra portuguesa “saudade”, não tem tradução. É assim uma espécie de aconchego com consciência e entre amigos

Tem bons salários, saúde e educação públicas, baixo nível de corrupção, igualdade entre homens e mulheres – mas também têm noites que não acabam e poucas horas de sol, nesta altura do ano.

Nem por isso são menos felizes. Pelo contrário, ano após ano, acabam por ser considerados os mais contentes com a vida em todo o planeta. Agora, o mundo está de olho neles, à procura da chave para essa felicidade toda – e parece que está na palavra hygge, que dita corretamente em dinamarquês soa a huga. Podemos traduzi-la por uma espécie de aconchego, mas dizem os especialistas – e quem ensina o conceito – que é muito mais do que isso. Bem aplicado, insistem, é mesmo toda uma filosofia de boa vida – e isso é o que o mundo inteiro está a querer copiar: só este ano, foram lançados seis livros sobre o assunto. E vem aí mais um: O Livro do Hygge, de Meik Wiking, CEO do Happiness Reasearch Institute (ver entrevista ao final do post).

Mas o que é isso de hygge?

Os exemplos são simples – por exemplo, beber um chá quente à frente de uma lareira. Mas pode ser uma reunião de famílias e amigos, um jantar à luz das velas ou tempo para ler um bom livro: em comum, todos demonstram que se trata de um povo pouco dado a privações forçadas. “Procuramos ser amáveis connosco e com os outros”, explicava, no final do verão, Helen Russel, por altura do lançamento do seu O Ano de Viver Como os Dinamarqueses: Descobrindo os Segredos do País Mais Feliz do Mundo, numa tradução à letra. “Não é algo que se possa comprar, é preciso investir tempo”, avisou já, também, Jeppe Trolle Linnet, autor do primeiro artigo académico sobre este conceito.

Apelo aos sentidos

Os teóricos do assunto são também unânimes em afirmar que é algo para ser sentido. Seguindo o pensamento de Meik Wiking, bastam os dedos de uma mão para elencar as melhores maneiras de ser hygge. Comecemos pelo paladar: o sabor a hygge é quase sempre familiar, doce e reconfortante. Se quiser preparar uma chávena de chá mais hygge, basta juntar mel. Se quiser fazer um bolo mais hygge, acrescente cobertura. Se quiser um guisado mais hygge, junte vinho.

Segue-se a audição: saiba que o crepitar dos troncos na lenha a arder é dos sons mais hygge que podemos encontrar – mas há outros. Na verdade, tem mais a ver com a ausência do som, aquele silêncio que nos permite ouvir os pingos da chuva ou o vento a soprar lá fora. O som de alguém a cozinhar ou a tricotar servem o mesmo propósito. O olfato é o sentido que vem depois. Já cheirou algo que o faça recordar de um tempo e lugar onde se sentiu seguro, que lhe relembre o mundo quando era criança? O aroma hygge é esse: é o que nos deixa descansados, o cheiro da manta preferida que usamos em casa, ou aquele que nos faz lembrar um lugar ou estado de espírito em que nos sentíamos completamente seguros.

Vamos então ao tato. Imagine-se a deixar os dedos percorrerem uma superfície de madeira, ou uma peça de cerâmica quente, ou uma pele de rena: tudo isso é hygge. Tudo o que é artesanal e caseiro, que demorou tempo a criar, também – e sempre mais do que as peças novas. No fundo, é qualquer coisa feita pela mão humana: um objeto de madeira, cerâmica, lã, pele, couro…

E, finalmente, podemos também ver o hygge. Já o dissemos aqui, depende muito da luz – mas, atenção, luz a mais não é hygge. Como tem a ver com tempo, acrescente-se que é atenuado, rústico e lento. No verão, é hygge comemorar o solstício à beira-mar; no inverno, ver a neve cair lentamente – coisa mais fácil para um dinamarquês do que para um português, diga-se.
E agora, que chegámos até aqui, sabemos finalmente que não há quaisquer razões para não ter umas festas felizes e entrar no ano novo com o pé direito. Afinal, descontando talvez a neve, não há nada nesta lista que não encontre por perto. Certo?

A palavra hygge não tem tradução. Como é que a caracteriza?

Diria que é a arte de criar uma atmosfera simpática, seja onde for. Envolve, geralmente, companhia, silêncio, lareira… Aqui há tempos tinha ido com amigos fazer escalada; no regresso, preparámos o momento, acendendo o lume e preparando uma bebida quente.

Alguém disse: “Mais hygge só se estivesse tempestade lá fora.” É um exemplo. Penso que acontece em todo o mundo. A diferença é que nós falamos disso e temos uma palavra própria. Diria que é algo da nossa cultura, do nosso ADN.

Quando é que teve noção do poder deste conceito?

Crescemos com tudo isto. Estou um bocado boquiaberto com todo este sucesso. O livro já está traduzido em 25 línguas. Criámos o Happiness Research Institute para estudar o tema, e hoje sabemos que tem muito a ver com a forma como vivemos as coisas.

Por exemplo, passar uma tarde preguiçosa a aproveitar o bom tempo é hygge mas só se o fizermos sem culpa. Resume-se à ideia de fazer o bem a nós e aos outros, sem cobranças. O mundo moderno exige-nos demasiado que sejamos saudáveis e produtivos, e essa pressão muitas vezes faz-nos mal porque não nos deixa ter prazer pelo prazer.

É essa a razão para os dinamarqueses serem o povo mais feliz do planeta?

Há alguns anos que ocupamos os lugares do topo, mas considero que isso tem mais a ver com as políticas do nosso país: temos educação e saúde gratuitas, boas condições de trabalho, igualdade salarial, enfim.

É sobre essa base que, depois, podemos ser hygge. Mas, mesmo não tendo isso tudo, penso que é possível ser-se mais feliz se apostarmos em boas experiências no dia a dia e isso é muito hygge! Em vez de apostar tudo numa conquista de uma vida, muito mais difícil de alcançar.

Fonte: Visão.sapo.pt

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