Portugal é hoje um destino muito procurado por quem planeja emigar, principalmente por grande parte dos brasileiros. O clima, a língua, a culinária e o baixo custo de vida tem atraido cada vez mais.
Mas por outro lado existe um grande número de portugueses que buscam novas oportunidades em um novo país.
O Europamos entrevistou alguns Portugueses e abordou algumas questões para entender o pôrque a Irlanda tem sido um destino muito escolhido por eles, e quem sabe pode ajudar a você que pretente escolher a Irlanda para chamar de lar a esclarecer algumas dúvidas.
No Post de hoje conversamos com a Sara que se mudou sozinha para Dublin e deixou para abraçar uma nova oportunidade de emprego, acompanhe como foi essa trajetória e seu ponto de vista em relação à essa mudança.
Europamos: Nome e Idade, cidade que morava em Portugal. Há quanto tempo mora na Irlanda?
Chamo-me Sara Ramos, tenho 34 anos e sou de Lisboa, alfacinha de gema! Vivo na Irlanda desde meados de março de 2016.
Europamos: Por que escolheu a Irlanda? Quais os fatores que influenciaram nessa decisão?
Julgo que foi mais a Irlanda que me escolheu a mim. Não estava a ponderar sequer sair de Portugal, quando me caiu nas mãos uma proposta de uma empresa de cá. De início recusei, pois os sentimentos de aquilo de que teria de estar afastada, nomeadamente toda a realidade que conhecia iria estar longe, falaram mais alto.
O que me influenciou na mudança de ideias foi a persistência dessa proposta, mesmo após ter recusado continuaram a insistir para eu vir para cá pois precisavam de mim, este tipo de atitude é raro ver-se em Portugal, normalmente quando se recusa eles passam logo ao próximo candidato da lista. Além disso a língua utilizada no dia a dia na Irlanda é o inglês.
O facto da Irlanda pertencer à comunidade europeia e não ser necessário nenhum visto para um europeu vir para cá viver pesou favoravelmente na hora de decidir. A juntar a esses factores a Irlanda está a uma distância de voo directo de menos de 3h, o que ajuda a relativizar a distância.
Europamos: Trabalha ? Qual a área?
Trabalho na área de IT, como analista.
Europamos: Estuda? Qual curso?
Não, quando acabei os estudos com o mestrado em engenharia informática, decidi que apenas voltaria a estudar se encontrasse alguma pós-graduação bastante aliciante. Pois de resto já se acaba por estudar no dia a dia diversas actualizações inerentes ao ramo de IT.
Europamos: Chegou na Irlanda com qual nível de inglês?
É sempre um pouco difícil avaliarmo-nos a nós próprios, mas diria que o meu nível de inglês aquando da minha chegada seria bom, razoável. Já tinha anteriormente trabalhado em clientes cuja documentação era em inglês, por isso ler, escrever e falar em inglês não era novidade para mim.
Europamos: Houve um planejamento? Por quanto tempo?
Bem o primeiro planeamento foi o mental que consistiu em chegar à conclusão que seria uma boa experiência para mim quer a nível profissional, quer a nível pessoal, com um risco calculado pois caso não me adaptasse ou algo corresse mal tinha sempre a minha casa em Lisboa para onde voltar. Esse planeamento ainda durou uns quantos meses.
A nível burocrático, deixar tudo tratado por lá para vir para cá viver e ainda ter tempo para tirar umas férias para me despedir de Portugal e comunicar a decisão aos amigos teve uma duração de cerca de dois meses.
Europamos: Qual foi a sua maior dificuldade quando chegou?
A maior dificuldade cá é sem dúvida arranjar casa, o mercado imobiliário é de loucos, existe muito mais procura do que oferta, o que faz disparar os preços em flecha. Para mim também foi uma dificuldade contudo, felizmente, tive ajuda de quem já cá estava e tinha passado pelo mesmo e isso aliado a um pouco de sorte fez-me ultrapassar esse obstáculo.
Europamos: O que mais gosta no país? O que não gosta?
Bem neste ponto vou ter de tocar em certas matérias mais sensíveis relativamente ao que não gosto.
Mas vamos primeiro ao que gosto:
Respeito relativamente às profissões – vê-se crianças pequenas nos autocarros que tomam desde logo a iniciativa, sem serem os pais a ter de lhes lembrar, de dizer obrigada ao condutor do autocarro antes de saírem. Além disso o horário de fecho dos estabelecimentos é respeitado.
Não intromissão das pessoas na vida dos outros – não é estranho por vezes algumas pessoas saírem à rua em roupão e ninguém liga nem comenta pois para eles é algo normal e que faz parte da vida dos outros.
Simpatia, prestabilidade e modo de tratamento carinhoso por parte das pessoas de mais idade – os irlandeses em regra são simpáticos e gostam de bem receber e ajudar, pois eles próprios são um povo que está habituado a ir viver fora do seu próprio país.
Além disso é comum, pelo menos na zona em que vivo que é uma espécie de bairro típico, as pessoas mais idosas passarem por nós e darem um bom dia com um sorriso nos lábios e responderem a perguntas com um tratamento carinhoso de “love”, “dear”, “darling”, algo que nos faz sentir bem.
Não se adiar convívio e saídas devido ao clima – em Portugal quando está mau tempo por vezes adiam-se os planos pois como não é assim tão comum estar mau tempo é fácil fazer essa gestão. Cá é diferente uma vez que nunca se sabe o tempo que se vai apanhar nada é adiado, não se vive em função do tempo, caso contrário quase não se vivia.
Relativamente ao que não gosto:
Clima – aqui consegue-se apanhar quase quatro estações senão num dia, numa hora. Digo quase pois nunca cheguei a assistir a verão cá, visto que eles consideram que uma onda de calor é quando se registam temperaturas à volta dos 22ºC, se os termómetros chegam aos 26ºC cá é a loucura! Isso a meu ver e devido aos meus padrões portugueses trata-se de primavera e não de verão;
Interferência da religião na vida das pessoas – a interferência do catolicismo chega a um ponto em que não é possível comprar pílula contraceptiva nas farmácias sem receita médica e para os médicos irlandeses a passarem é o cabo dos trabalhos, pois normalmente tem de se levar com uma lavagem cerebral acerca de planeamento familiar e que é muito importante ter filhos, tendo de por vezes se alegar razões terapêuticas para se obter a receita médica ou então trazer de Portugal.
Para além da questão mais sensível da proibição do aborto, punível com pena de prisão, em todos os casos, mesmo em casos de violação, má formação do feto ou perigo para a saúde da mãe que leva à hipocrisia de muitas mulheres irem abortar a Inglaterra e se tiverem complicações de saúde daí provenientes, terem de mentir cá aos médicos pois estes pela lei são obrigados a reportar, aquilo que é considerado um crime por lei;
Sistema de saúde – eu pensava que o sistema de saúde português não era lá grande coisa até chegar cá e conhecer o sistema de saúde irlandês.
Médico de família (GP) é um conceito que cá não existe com os nossos moldes e existe um bocado de negócio com isso, visto que em vez de se poder consultar directamente um especialista privado (exceptuando raras excepções de algumas especialidades como dentista e oftalmologista), tem de se ir primeiro ao médico de clinica geral só para se pagar uma consulta, pois ele nada faz e apenas escreve uma carta que permite a admissão do paciente na especialidade necessária;
Gastronomia – tirando os assados e estufados que são bons, a comida é um pouco parecida à inglesa que tem um grande nível de gordura e não é das mais saudáveis, razão pela qual a maioria das pessoas cá de nacionalidades ligadas à cozinha mediterrânica faz a comida em casa e leva para o trabalho.
O almoço normal dos irlandeses é uma sandes à pressa, não têm a nossa cultura de comer uma refeição completa, tirando prazer da comida e da companhia de amigos ou colegas à volta da mesa. Além de que alguns dos produtos que utilizamos na gastronomia portuguesa ou não existem cá, ou são bastante difíceis de encontrar e usualmente a preços excessivamente caros;
Alguma legislação – a legislação relativa ao álcool em que apenas se consegue comprá-lo a determinadas horas estabelecidas não me faz sentido, visto que se precisarmos por exemplo de temperar comida com algum vinho e tivermos de o comprar no dia temos de esperar pelas 13h. Sei que cá existe um problema de abuso de álcool mas não julgo que essa seja a solução, pois quem se quiser embebedar de manhã basta ter comprado o álcool no dia anterior. Além de que nem sequer nas farmácias, nem nos hospitais, existe álcool etílico para desinfecção, segundo o que me foi dito, se existisse poderia ser utilizado pelas pessoas para o beberem!
Europamos: Quais os pontos positivos de morar na ilha de esmeralda em relação a Portugal?
Os pontos que considero mais positivos da Irlanda em relação a Portugal são: a utilização da língua inglesa o que permite, por exemplo, tratar as pessoas por “you” no inglês o que não obriga por vezes a decidir se o mais apropriado é tratar por “tu” ou por “você”, pois serve para ambos os casos sem distinções; o maior respeito pelos empregados relativamente a horários de trabalho e certas profissões que em Portugal são vistas como profissões inferiores, cá não são encaradas da mesma forma.
Europamos: Quais os pontos positivos de Portugal em relação a Irlanda?
Diria que os pontos positivos de Portugal em relação à Irlanda são: o bom clima; a boa gastronomia; o facto do comércio estar aberto até mais tarde; relativamente à simpatia, embora a maioria dos irlandeses seja bastante simpática, a simpatia deles comparada com a nossa simpatia é mais contida, mais formal, nós somos mais calorosos, temos sangue mais quente a correr-nos nas veias.
Europamos: O salário que recebe na Irlanda compensa para se ter uma vida digna?
Sim, felizmente no meu caso não me posso queixar.
Europamos: Sobre o clima, gosta, não gosta? É possível conviver com graus negativos? Muda o humor?
Sendo totalmente sincera, é difícil apanhar alguém que goste do clima cá, os próprios irlandeses estão acostumados mas a maioria não gosta, daí escolherem sempre férias em climas como o nosso. É verdade que este facto não se deve apenas ao nosso clima mas também ao custo de vida que é mais barato em Portugal e Espanha por exemplo e também à facilidade de comunicação, pois em Portugal é difícil encontrar alguém que não fale inglês e, sem parecer pretensiosa, diria que na maioria somos um povo bastante amistoso e prestável.
Quanto a graus negativos felizmente não os apanhei por cá muitas vezes e apenas vi nevar 5 minutos. Pelos relatos que tenho de irlandeses o último inverno foi mais “suave” do que é usual.
Mudanças de humor suponho que dependa de pessoa para pessoa, no meu caso tem muita influência, tempo mau deixa-me com a neura, com o modo “Não me chateiem nem se aproximem muito de mim de momento que posso morder!” activado. Mas julgo que seja por ter nascido num clima diferente e não estar acostumada. Normalmente vê-se a diferença de alegria, abertura em termos de mentalidade, de quem nasceu em climas mais quentes versus climas mais frios.
Além disso, a falta de sol também pode influenciar a saúde e não só a emocional, visto que a vitamina D, proveniente do sol, também é muito importante por exemplo para os ossos. Daí a importância de, quem não venha de um país com um clima semelhante ao de cá, tomar suplementos vitamínicos que incluam a vitamina D, principalmente no inverno.
Europamos: Comparando o custo de vida x salário entre Portugal e a Irlanda, na sua opinião qual local oferece uma qualidade de vida melhor, sem preocupações?
Esta pergunta não é muito simples de responder uma vez que em Portugal eu não tinha tantos encargos com a renda da casa. Suponho que para quem tenha bastantes encargos em Portugal, a Irlanda compense em termos monetários, caso se consiga arranjar um trabalho que seja bem recompensado, normalmente isso acontece mais nas áreas de IT e enfermagem. Mas isto é tendo em conta apenas o custo de vida versus salário. Na minha opinião qualidade de vida não se baseia só nisso mas em diversos factores como clima, gastronomia, etc…
Europamos: Quando chegou no país já possuía um trabalho ou aplicou para a vaga quando estava por cá?
Quando cá cheguei já tinha assinado um contrato de trabalho permanente.
Europamos: Tem planos de ficar ou voltar para Portugal?
Indubitavelmente voltar para Portugal! Foi lá que nasci, cresci, me tornei no que sou hoje. Estão lá as minhas raízes, origens, família, amigos.
Para mim a Irlanda é uma experiência enriquecedora em termos profissionais e pessoais e pretendo levar daqui comigo (no coração e quem sabe combinar algo de vez em quando para matar saudades) amigos, situações pelas quais passei e que foram bastante importantes para mim, mas não há nada como a nossa casa e essa sempre esteve e estará em Lisboa e aberta a todos eles. Irlanda é a segunda casa.